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Um livro sobre o neofascismo

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Ivan Maciel de Andrade                                                                                                           
Procurador de Justiça e professor da UFRN (inativo)

A tática mais utilizada pelo neofascismo para se implantar é a de dividir a sociedade, estabelecendo dois lados: “nós” e “eles”. Esse é o ensinamento de Jason Stanley, professor de filosofia da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, autor do livro “Como funciona o fascismo – A política do ‘nós’ e ‘eles’”. O marxismo, adverte o autor, também divide a sociedade em classes (a dos proprietários e a dos não detentores dos meios de produção). Já o neofascismo adota distinções entre “nós” e “eles” recorrendo a fatores étnicos, raciais, religiosos, de gênero, de nacionalidade. É criado sempre um “passado mítico” em que teriam sido praticados valores (ideais) que se acham ausentes da atual realidade sociopolítica. Esse passado mítico pode ser até mesmo um período de autoritarismo, que se tenta reabilitar, contra todas as evidências, em nome de uma artificial e esdrúxula revisão histórica.

O capítulo que, no entanto, considero mais interessante desse livro – por similitudes que não me parecem constituir mera coincidência – é o que foi intitulado de “anti-intelectualismo”. A política fascista declara guerra à educação, ao conhecimento, às universidades e à própria linguagem (como instrumento de debate de ideias e convicções). Com que objetivo? De “solapar a credibilidade das instituições que abrigam vozes independentes”, capazes de promover contestações e divergências.

Reconhece o professor da Universidade de Yale: “Nos últimos cinquenta anos, pelo menos, as universidades têm sido o epicentro de protestos contra a injustiça e o excesso de autoridade”. E vai em frente: “Sempre que o fascismo ameaça, seus representantes e facilitadores denunciam as universidades e escolas como fontes de ‘doutrinação marxista’, o bicho-papão clássico da política fascista”. Veja-se bem: o neofascismo usa uma imaginária doutrinação marxista como bicho-papão.

Passa a ser comum o discurso que acusa professores politizados de desviarem os estudantes de sua formação profissional, com prejuízo para o futuro deles e do país. Algumas disciplinas das áreas de ciências humanas e sociais são consideradas indesejáveis, por supostamente fomentarem posições esquerdistas ou marxistas. David Horowitz, ativista de extrema direita dos Estados Unidos, moveu, a partir da década de 1980, campanhas contra as universidades e a indústria cinematográfica. Esse ativista publicou, em 2006, um livro com o título de: “Os professores – 101 professores mais perigosos da América”. Em 2009, publicou outro livro: “Os 150 cursos mais perigosos da América”. Revela Jason Stanley que “o governo Trump tem seguido agressivamente o programa de Horowitz.”

Sabe-se que nem sempre a política fascista se concretiza historicamente num governo fascista, por falta das precondições para sua implantação. Mas a política fascista em si é altamente danosa – à democracia, ao desenvolvimento científico, à proteção do meio ambiente, à defesa dos direitos humanos, a qualquer avanço civilizatório. As universidades, a mídia, a cultura e as artes são os inimigos mais temidos e odiados pelo neofascismo. Vê-se, assim, que o livro do estadunidense Jason Stanley é fundamental para se compreender o que tem acontecido nos últimos tempos em nosso país.

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