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Uma carioca nos encantos da Vila

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Ramon Ribeiro
Repórter

Poeta, artesã e ativista social, a carioca Deth Haak encontrou na Vila de Ponta Negra um ambiente que lhe remeteu afetivamente a sua terra de origem, Búzios, no litoral do Rio de Janeiro. Na sua chegada a capital potiguar, em 1989, não deu outra: paixão à primeira vista. Hoje, quase 30 anos depois, ela está totalmente integrada ao cotidiano local, às raízes culturais e às histórias dos moradores. Tamanho envolvimento a move na luta pela preservação ambiental e valorização cultural da Vila.

Para Deth, viver próximo ao Morro do Careca, principal cartão postal de Natal, tem seus encantos e responsabilidades. “Ser vizinha do Morro do Careca é acirrar o compromisso de preservar e protegê-lo para as gerações futuras”, diz.
Deth Haak é empreendedora, artesã e ativista cultural
Deth Haak é empreendedora, artesã e ativista cultural

Foi próximo ao Morro do Careca, por sinal, que a carioca fez fama ao unir gastronomia e arte com seu restaurante Coco Beach, espaço à beira mar (onde hoje é o Old Five). Para 2018, Deth pretende retomar o empreendimento, com novo nome, mas com mesma proposta cultural. “A Vila é um rico reduto de manifestações culturais, berço de mestres do folclore potiguar. Queremos trazer toda essa tradição para a beira do mar”, conta Deth, que também é artesã, desenvolvendo em seu ateliê “Poesia na Cabeça” bolsas e artigos diversos.

Essa tradição cultural da Vila Deth defende que seja mais valorizada para que não caia no esquecimento. Para ela, essas manifestações são um dos maiores potenciais do bairro. Tanto que já existe projeto na Vila que oferece aos visitantes a oportunidade de vivenciar experiências com artistas e artesãos locais. É o Território Criativo. Deth vê essa relação  entre moradores e turistas como importante para o desenvolvimento da comunidade, desde que feita com harmonia, o que acredita estar acontecendo.

Enquanto poeta, a carioca se rende aos mais variados aspectos de Ponta Negra para ganhar inspiração. Em seus versos se encontram o vento, o sol, o mar, e muito da atmosfera local. Nesta entrevista, Deth recorda sua chegada à Vila, conta histórias de pescador, destaca as potencialidades do lugar e sugere ações que podem torna a vida de todos melhor.

Vila em 1989

Quando cheguei a Vila encontrei um lugar bucólico que na hora me remete a aldeia de pescadores lá de Búzios, onde nasci. Ruas sem pavimento, bares interessantes como o Bodega da Praça, o Bar do Buraco, Rango de Mãe, que hoje é a Tapiocaria da Vó. Perto de casa tinha o Empaia Caminium, que hoje é o Ferreiras Bar. A falta de luz elétrica me encantava. Faziam as estrelas parecer que chegavam em nossas mãos. A Vila, nessa época, era toda poesia. Era e continua sendo um encanto.

Lobisomem

Uma coisa que me marcou foi a histórica do lobisomem. Quando cheguei na Vila vi que entre os pescadores se contava a história de um lobisomem que em noite de lua cheia aterrorizava os meninos. Fiquei impressionada que, naquela época, mesmo com televisão, os meninos ficavam trancados em casa nos dias de lua cheia com medo do lobisomem.

A Vila em verso praianos

A Vila me influencia muito na escrita. Minha poesia é repleta de coqueiros, vento, mar, de babado de espuma. Assim como das dores que sangram nessa aldeia, que aparecem em poemas críticos e de preservação ambiental.

Mais áreas de convivência

Se tivéssemos espaços para que nossas crianças convivessem em harmonia com esporte, lazer, recreação, se tivéssemos ações que valorizassem o estar junto, calçadas mais largas e melhor ambientadas, com certeza a Vila seria um verdadeiro paraíso.

Reduto da cultura popular

A Vila é reduto de cultura popular. Tem o Congo de Calçola de Mestre Correia, coordenador por seus filhos, tem o Bambelô do Mestre Pedro, o Bambelô Maçariquinho da Praia, assumido pelo filho de mestre Sebastião Matias, tem o Pastoril de Dona Helena, tem a Lapinha. Mas a falta de valorização desses mestres é um problema. Um problema não só da Vila, mas do Brasil. O país parece ter como meta apagar a memória. Se o Estado não fosse a terra de Câmara Cascudo e Deífilo Gurgel eu não sei aonde estaríamos hoje, sem preservar nosso passado. Enquanto agente de cultura, fazemos um trabalho de resgate dessas memórias entre as crianças. Por que são elas que vão passar essa tradição pra frente.

Visitantes e moradores

Com o Território Criativo mapeamos os redutos da Vila buscando os seus encantos. Hoje estamos trabalhando o turismo de experiência. Temos espaços que podem haver interação entre quem nos visita e quem vive aqui. Como por exemplo, uma aula de pintura em dois ateliês que existem na comunidade, um de Lídia Quaresma e outro do  de Oswaldo Oliveira, onde o visitante vive o momento criativo. Já na Tapiocaria da Vó, reduto das rendeiras, tem um momento cultural que se chama “zuada de birro”, onde o turista tece com as rendeiras, degusta tapioca, ouve histórias. O Território Criativo não criou nada. Chegou para aprimorar e dar visibilidade ao que já existe. Tem sido muito interessante esse trabalho.

Do morro para a beira mar

Assim que cheguei na Vila, montei próximo ao Morro do Careca o restaurante Coco Beach. Era um espaço onde também promovíamos exposições, lançamentos de livros. Quando fiquei viúva parei com o empreendimento e hoje, depois de toda a bagagem do Território Criativo, vislumbrei voltar para a beira da praia, mas com uma roupagem nova, outro nome, mas mesma proposta no cardápio. A ideia é fazer com que toda a cultura da Vila desça para a praia. Queremos que todos que visitam a Praia de Ponta Negra tenham conhecimento das manifestações artísticas da comunidade. Então, já de antemão, não se assustem se em julho encontrarem à beira mar um grupo de pastoril dançando, roda de coco.

300 anos de história

Temos importantes eventos na Vila. O Coco no pé no Morro do Careca, a comemoração do Dia do Folclore, o São João e um Cortejo anual que a gente promove, reunindo diversas manifestações culturais da Vila. Caminhamos cantando e encantado os moradores e visitantes. O que a gente busca é o que está acontecendo: ver a cultura em movimento, através dos moradores, valorizando os 300 anos de história da Vila de Ponta Negra

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