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Uma livraria a menos em Natal

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Yuno Silva – repórter

Natal é a cidade dos paradoxos, onde a quantidade de escritores e poetas que lançam novos títulos é inversamente proporcional ao número de bibliotecas públicas e livrarias em funcionamento. A Biblioteca Câmara Cascudo por exemplo, a maior do Estado e a única da cidade com portas abertas para atender o público em geral, está fechada desde o início deste ano; enquanto a rede de livrarias com capital 100% potiguar e 34 anos de mercado acaba de anunciar o fechamento da maior loja da rede: a Potylivros do Praia Shopping, em Ponta Negra, encerra suas atividades no próximo dia 31 de dezembro após quase seis anos no endereço.
Com um faturamento 40% menor, após as mudanças de local, livraria âncora do Praia Shopping encerra suas atividades no próximo dia 31
Para a data não passar em branco, habitués e frequentadores de plantão se despedem da livraria promovendo o sarau “Café com Poesia” no sábado (29), a partir das 15h.

Os motivos para justificar essa decisão esbarram em questões comerciais: após a mudança do ponto onde a loja estava instalada dentro do próprio shopping (onde hoje funciona a Lojas Americanas), em junho do ano passado, o movimento caiu cerca de 40% e desde então não houve como recuperar o fôlego. “Como antes tudo funcionava no térreo, as pessoas viam um amigo através do vidro e isso gerava movimento na livraria. Na época, com a Central do Cidadão funcionando ali próximo, também tínhamos um bom fluxo de clientes”, disse José Nizário Gomes, sócio-diretor da Potylivros. “Historicamente, uma loja térrea vende mais que uma com primeiro andar”, avalia. 

De acordo com ele, faltou sinalização adequada para indicar o novo local. “Muitos clientes acharam que a livraria havia fechado”, recorda Nizário, ressaltando que a administração do shopping cumpriu com o acertado ao instalar elevador para acesso ao mezanino e arcar com a adequação da estrutura. “Nada impede de, no futuro, reabrirmos outra loja no Praia Shopping. O importante é que estamos saindo sem fechar portas”, acrescentou Cleodon Xavier Gomes, também sócio-diretor da empresa. Eles apontam outros detalhes como agente dificultador: a escada ficou mal localizada e há uma rampa para acessar o “barulhento” elevador. Ambos são irmãos do editor e livreiro José Xavier Cortez (da Cortez Editora), fundador da livraria que começou como distribuidora há mais de três décadas.

A proposta agora é investir na loja da Salgado Filho como espaço cultural, inclusive decidimos esta semana que iremos movimentar o café que estava no Praia Shopping por lá, “já a partir de janeiro”, informou Cleodon. “E está nos nossos planos futuros reativar o mezanino (da filial Salgado Filho), criar um auditório”, adianta José Nizário.

Loja virtual

Empresa de perfil familiar (de Currais Novos), a Potylivros resolveu encolher para se reestruturar, encarar a competitividade do mercado e os novos paradigmas do setor: em 2013 concentrará esforços em Natal e na criação de uma loja virtual, esta já em curso. A empresa fechou filial no Recife e em breve deverá baixar as portas em Mossoró, no entanto permanecerá com a matriz na rua Felipe Camarão, Cidade Alta, e as lojas da Salgado Filho (ao lado do Natal Shopping) e da UnP Roberto Freire. No próximo ano, a matriz passará por uma reformulação geral em seu layout, com novas estantes e sinalização. 

“Apesar da tendência apontar para os shoppings, as lojas de rua não vão deixar de existir nunca, pois são nessas lojas onde o cliente consegue os melhores descontos. O catálogo também é maior, pois não há a necessidade de expor apenas best-sellers e lançamentos. O que está faltando, no caso de Natal, é a Prefeitura cuidar melhor do centro, melhorar a iluminação, segurança, limpeza”, diz Nazário, chamando atenção para o lixão formado na esquinas das ruas Felipe Camarão e Coronel Cascudo, na Cidade Alta.
Livraria Poty do Praia Shopping encerra as atividades dia 31. Café e acervo vão incrementar a loja da av. Salgado Filho, a partir de janeiro. Apesar do encolhimento, diretores não falam em crise
“Trabalhar com uma estrutura mais enxuta faz parte da reestruturação da Potylivros”, explicou Cleodon, justificando o fato da matriz ter incorporado o setor de papelaria que funcionava em um prédio em frente. Quanto às vendas pela internet, ele acredita que a concorrência dos e-books (livros digitais) não preocupa. “O precisamos é recuperar terreno na venda de livros impressos pela internet”. O empresário admite que a reestruturação da livraria mexeu “um pouco com o fornecimento, mas vamos trabalhar para regularizar isso”.

Nizário e Cleodon garantem que o mercado literário está aquecido, pois “nunca se lançou tanto livro”, mas a falta do hábito da leitura do brasileiro (e do natalense) é notória. Também vale registrar que, de acordo com informações do Ministério da Cultura, a venda de livros em 2011 cresceu; não tanto pela trânsito de leitores nas livrarias, e sim pela compra de títulos por parte dos governos para escolas e bibliotecas públicas – ano passado o Governo Federal investiu cerca de 1,3 bilhão na aquisição de novos acervos.

BATE-PAPO

José Xavier Cortez, livreiro e editor da Cortez Editora 

Editor diz que poder público precisa fazer sua parte
Mesmo morando em São Paulo, o senhor conhece bem a dinâmica do mercado literário local. Qual o sentimento diante do fechamento de uma loja da Potylivros?

Fico muito triste quando fechamos uma livraria, lamento profundamente. A loja do Praia Shopping era importante para a rede e isso não é um bom sinal, pois vejo o retrocesso na área da Cultura como algo perigoso; algo que faz mal ao país, aos estados e aos municípios. Tenho a impressão que os governantes do RN, infelizmente, tanto estadual quanto municipal, têm investido pouco ou quase nada em livros. No Ceará e Pernambuco, por exemplo, os governos têm adquirido acervo para equipar e renovar bibliotecas.

A falta de investimento público, então, é a principal explicação para a crise no setor?

Não, o índice de leitura no Brasil também precisa melhorar, estamos bem abaixo da média de leitores na América Latina. Para termos uma ideia mais localizada da questão, lançamos o livro “Cascudinho – o menino feliz” (de Cristine T. da Cunha Lima Rosado e Diógenes da Cunha Lima) pela Cortez Editora com boa aceitação da crítica e da imprensa, mas não tivemos boas vendas no RN. Nenhuma escola do RN nos procurou, o Governo também não demonstrou interesse, e olha que foi escrito por um autor conhecido sobre um personalidade cultural importante. O livro foi indicado em várias bibliotecas de outras partes do país, vende bem em São Paulo e em Pernambuco, e no nosso Estado? Professores, diretores de escolas, gestores públicos e os próprios pais têm que estar ligados nessas questões, pensar mais no livro. Livro é investimento e não custo.

Mas o mercado literário não é, historicamente, pequeno no Brasil e em Natal em relação a outros lugares?

Então como explicar a vinda de empresas estrangeiras para cá? Será que é por que não vende, por que não tem mercado?

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