domingo, 28 de abril, 2024
26.1 C
Natal
domingo, 28 de abril, 2024

Valoroso Potiguar

- Publicidade -

Agora, no dia 22, um sábado, ocorre o centenário da morte do capitão José da Penha, uma das figuras mais notáveis da política do Rio Grande do Norte, nascido no sertão de Angicos (“O meu coração tem a dureza daquelas pedras. E com este rochedo de carne, hei de esmagar a oligarquia dominante”). Militar (capitão do Exército), orador, jornalista, escritor, deputado estadual, kardecista, patrono da cadeira 34 da Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, José da Penha foi quem liderou a primeira campanha politica popular no Rio Grande do Norte, quando levantou o povo contra o governo Alberto Maranhão que apoiava a candidatura de Ferreira Chaves à sua sucessão e cujo grupo político estava no poder há mais de vinte anos.

Não sei se haverá celebrações, se a memória de José da Penha será lembrada pelas instituições culturais e políticas do Estado. Se a Prefeitura de Angicos, onde ele nasceu (“Taboleiros, onde minha infância perseguiu borboletas”), realizará algum ato ou se a prefeitura da cidade de José da Penha, na “tromba do elefante” irá homenagear seu patrono, um “paladino da República, vibrante e idealista” como o definiu Luís da Câmara Cascudo. Lembro-me quando do centenário de seu nascimento, dia 13 de maio de 1975, o Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, presidido por Enélio Petrovich,  abriu suas portas para reverenciar a memória do ilustre potiguar. O conferencista foi o ex-governador Aluizio Alves, seu conterrâneo de Angicos.

A conferência de Aluízio foi publicada numa plaquete no ano seguinte com o título “A primeira campanha popular no Rio Grande do Norte”. A capa é de Newton Navarro. Está carecendo de ser reeditada. Por onde andará o desenho de Navarro?  Num dos capítulos do seu ensaio, Aluízio escreveu:

“Tudo conduzia J. da Penha às lides políticas. Seu ardente ideal republicano, impregnado de pregação de Benjamim Constant, o gosto pelo estudo de História dos povos, a vivência jornalística conduzindo-o à análise dos fatos diários, principalmente os da formação da República emergente, a participação militar característica dos primórdios do novo regime, o espírito polêmico, fariam inevitavelmente do jovem pensador-militar um líder político.”

A campanha eleitoral de José da Penha, ocorrida em 1913 certamente serviu de inspiração para Aluízio Alves, 67 anos depois, percorresse o Rio Grande do Norte desfraldando as bandeiras verdes da Cruzada da Esperança que o levaria ao Governo do Estado. Conta Aluízio na sua conferência:

“A 6 de março (José da Penha) seguiu para o Ceará, de onde regressou a 19 – dia de São José, padroeira da cidade em que nascera, e inspiração do seu prenome – para iniciar a primeira campanha popular no Rio Grande do Norte. Deolindo Lima prepara letra a ser cantada nas ruas com a  popularíssima música da “Vassourinha”:

“Capitão José da Penha
Capitão José da Penha
Valoroso Potiguar!
Vem á bela Salinésia
Vem à bela Salinésia
Os “Marretas” derrotar!”

Por toda parte símbolos com as cores vermelha e amarela, retratos do líder nas lapelas, nas gravatas, nos lenços.”

Os “Marretas” eram chamados assim os simpatizantes governistas. Que  não ficaram calados. Pelo contrario, foram às ruas para baixar o pau (de verdade)  no lombo dos “pinuns” como eram tratados os seguidores de José da Penha. O mesmo que  a “gentinha” de 1960, lembra Aluizio.

De Cascudo a Alvamar
Luís da Câmara Cascudo dedicou uma de suas Actas Diurnas a José da Penha, com o título “Capitão José da Penha, valoroso potiguar”, publicada em A República no dia 22 de fevereiro de 1942, aniversário de sua trágica morte no Ceará, ocorrida  em 1914. Cascudo vai escrevendo:

“O nome de José da Penha Alves de Souza evoca o movimento de luta, o choque de ideias, a controvérsia, agitação, sonoridade. Não podemos pronunciar com  o mesmo ritmo arterial das evocações comuns. Nasceu, como diria Musset, muito cedo para um Mundo muito velho. A sua seria uma outra época, antes, na Revolução Francesa, ou depois, nas campanhas proletárias de reivindicações sociais. Nasceu agitador, filósofo, sociólogo, jornalista. Nasceu armado cavaleiro, de couraça e elmo, com bandeiras e montante, jurando combater o bom combate. Toda sua vida é uma série de guerrilhas, de batalhas, de agonias, de sofrimentos, arrostados, provocados, resistidos com altivez, destemor e sobranceira invulgares”.

O professor, advogado, escritor e excepcional ‘causeur” Alvamar Furtado de Mendonça foi o primeiro ocupante da cadeira 34 da Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, cujo patrono é José da Penha. Hoje, quem nela está sentado é  o jornalista e historiador Lenine Pinto, outro conversador admirável. No seu discurso de posse, com a saudação magnifica de Américo de Oliveira Costa, doutor Alvamar Furtado,  que faz uma passeio encantador por Natal do começo do século passado (estávamos em 1913), disse:

“O Diário de Natal (jornal da oposição ao governo Alberto Maranhão),  no dia 31 de janeiro, em primeira página, publica um clichê de José da Penha, com uniforme mal definido na péssima impressão gráfica, em modelo das velhas “garances” cheia de botões dourados e alto colarinho militar, ressaltando uma magra fisionomia meridional, marcada por um cavanhaque de personagem do Segundo Império. Um olhar de estranha e obstinada energia denuncia um espírito combativo. No texto, era chamado o “atleta da democracia”.

Enfrentando os jagunços
O capitão José da Penha morreu enfrentando os jagunços de Floro Bartolomeu, braço político do padre Cícero Romão Batista, que era desafeto do governador Franco Rabelo, correligionário e amigo de José da Penha. O angicano era deputado estadual no Ceará e morreu em combate. Esta história está contada no livro do jornalista e biógrafo Lira Neto, “Padre Cícero: Poder, Fé e Guerra no Sertão” (Companhia das Letras, 2009). Tinha 39 anos de idade.

Na campanha eleitoral de 1913, José da Penha morou na Ribeira, numa casa, em cujo terreno, anos depois, se ergueria o Grande Hotel, em frente a praça que hoje tem o seu nome. E que está abandonada. O seu busto, inexpressivo, precisa ser substituído por uma estatua de corpo inteiro, o capitão olhando na direção do cais Tavares de Lira (também abandonado) onde ele desceu do navio Olinda para o combate eleitoral que liderou sem ser candidato. Um romântico da República.

- Publicidade -
Últimas Notícias
- Publicidade -
Notícias Relacionadas