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Viva a democracia da poesia

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Yuno Silva
Repórter

“Sim, é perfeitamente possível se
ensinar a fazer poesia!”, afirma Frederico Barbosa, poeta, crítico
literário e atual diretor da Casa das Rosas, tradicional reduto dedicado
ao universo das letras fincado na cosmopolita-e-financeira Av. Paulista
(SP). “Os mesmos que defendem que uma pessoa nasce escritora, sem
considerar o contexto de um ambiente propício, também acreditam que a
poesia morreu. Essa grita (da morte) é antiga, (o dramaturgo grego)
Aristófanes já dizia isso em 405 a.C., e é disseminada por uma ala
conservadora que não enxerga o movimento que floresce na periferia”,
emenda. Para Barbosa, a reclamação deriva da “falta de controle” dessa
turma sobre os rumos da poética contemporânea.
Frederico Barbosa, poeta, crítico literário e atual diretor da Casa das Rosas, tradicional redutos dedicados ao universo das letras em São Paulo, diz que poesia pode ser  ensinada e que ela continua a florescer na periferia. O autor estará em Natal para a “Virada Poética”
 Entre os
convidados da primeira Virada Poética de Natal, evento promovido pela
Prefeitura/Funcarte, Frederico aterrissa na cidade esta sexta-feira (13)
para participar do debate “A poesia contemporânea e os movimentos
periféricos” marcado para às 17h na sede da Fundação Capitania das
Artes, com mediação do roqueiro e professor de Literatura Alexandre
Alves.

“A poesia tem mudado de mãos, prova disso são os roteiros
de saraus de quatro páginas que circulam por bairros da periferia daqui
de São Paulo – enquanto nos guias formais de jornais de grande
circulação não passam de pequenas notas na seção ‘passeios’”, lembrou
Frederico durante entrevista exclusiva por telefone ao VIVER.

O
diretor da Casa das Rosas contou que quando encontrou com Dácio Galvão
(secretário municipal de Cultura e presidente da Capitania), em São
Paulo, mostrou um mapa dos saraus que acontecem na capital paulista: em
três versões do levantamento, as ações saltaram saltou de 32 para mais
de 60 e hoje passam de 100 o número de eventos periódicos – a Casa das
Rosas realiza saraus . A Casa das Rosas  “Na Casa das Rosas temos saraus
semanais”,  A 

Nascido no Recife e radicado em Sampa desde os
seis anos, Frederico Barbosa, 54, cursou Física na USP, iniciou o curso
de Grego e formou-se em Letras. Durante alguns anos foi crítico
literário do Jornal da Tarde e Folha de São Paulo. Seu primeiro livro,
“Rarefato” (Iluminuras), foi escolhido um dos melhores de 1990; enquanto
o segundo, “Nada Feito Nada” (Perspectiva), de 1993, saiu com chancela
da Coleção Signos dirigida por Haroldo de Campos e ganhou o Prêmio
Jabuti. Seus poemas têm sido traduzidos e publicados em coletâneas de
diversos países como Estados Unidos, Austrália, México, Espanha e
Colômbia.

Barbosa é um dos fundadores da Poiesis – Organização
Social de Cultura, entidade responsável pela administração da Casa das
Rosas – Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura. Desde 2012 é
membro do Conselho Curador do Prêmio Jabuti.

Bate-papo – Frederico Barbosa, poeta e crítico literário

Frederico, como explicar essa explosão poética nas periferias?
Primeiro
temos que entender a palavra “periferia” de várias maneiras, e não só
como um lugar distante do centro habitado por pessoas de baixa renda. O
conceito extrapola a fronteira das cidades e da condição social.
Entendido isso, passamos para a pergunta: o que é preciso para se fazer
poesia? Só da cabeça, do pensamento, da criatividade, e se o autor for
bom de memória nem de papel e lápis. É uma arte que precisa apenas de
formação e informação, está ao alcance de qualquer um e na periferia
temos um movimento forte do RAP (do inglês ritmo e poesia).

Criolo é um desses exemplos…
Exato.
Ele e outros dessa geração apresentam um pensamento mais poético e
menos de batida. São figuras inteligentes que trabalham uma poesia mais
sofisticada, não no sentido de boa ou ruim e sim de uma poesia que
utiliza mais recursos, sai da mesmice e altera a linguagem cotidiana. Em
sua origem, a poesia sempre esteve atrelada a música e a performance,
surgiram juntas na época dos gregos, dos cantores medievais. No
transcorrer do tempo que acabaram se separando e estamos vendo um
retorno dessa proximidade. Apesar de revitalizador, há o perigo da
poesia ser dominada pela música, pelo autor que escreve pensando na
performance – isso traz o risco da coisa ficar meio óbvia, caricatural e
assim a poesia acaba perdendo força.

E essa ‘briga’ entre oralização versus publicação, que por sua vez está dividida entre impressos e virtuais?
Os
saraus são importantes, sem dúvida, mas não deixa de ser uma faca de
dois gumes pois o discurso pode ficar restrito ao discurso panfletário.
As coisas estão mudando rápido, mas o impresso continua sendo o mais
prestigioso mesmo com o maior alcance da internet. Mantive uma página
que teve mais de um milhão de acessos, quando vou ter um universo desses
com leitores no papel.

O que diria aos saudosistas que acreditam que tudo de bom já foi feito?
Diria
que o processo é complexo, e também tem a ver com a democratização do
Brasil onde mais pessoas estão tendo mais acesso a informação e cultura.
Na década de 1940 tínhamos vários grandes poetas, as pessoas se
conheciam, hoje não sabemos onde elas estão, as coisas estão mais
diluídas. Aí em Natal, por exemplo, admiro muito o trabalho de Avelino
de Araújo (autor do “Soneto do Apartheid”, publicado em 1984), na
Paraíba o Lau Siqueira. Quando mais gente produzindo, a tendência geral é
a qualidade baixar, e cabe a nós que trabalhamos com essa área saber
filtrar e mostrar os caminhos.

Então é possível aprender a fazer poesia?
Claro.
Para você ter uma ideia, a Casa das Rosas organiza um curso de
preparação de escritores com 30 vagas, e este ano tivemos quase mil
inscritos. Quem acredita que uma pessoa nasce escritora, desconsidera
que elas nascem em um ambiente propício com condições para se dedicar
aos estudos. Essa mesma turma reclama que a poesia feita na periferia é
ruim: pode até ser rudimentar, mas vejo novos autores sofisticando cada
vez mais suas obras.

CASA DAS ROSAS É EXEMPLO DE AQUISIÇÃO PELO PODER PÚBLICO

A
Casa das Rosas é espaço dedicado a poesia e literatura que funciona em
um casarão na Av. Paulista em São Paulo. No começo da década de 1980, o
casarão seria demolido para dar lugar a um prédio, mas o Governo
Estadual comprou o imóvel para instalação do centro cultural que desde
2004 abriga o acervo do poeta Haroldo de Campos (1929-2003). O lugar é
administrado pela Poiesis – Organização Social de Cultura, e contabiliza
10 mil visitam mensais.

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