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Zilda Arns: a morte de uma heroína

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Brasília  (AE) – A médica Zilda Arns está entre os mortos no terremoto do Haiti. A informação foi confirmada pela manhã pelo gabinete do senador Flávio Arns (PSDB-PR), que é sobrinho de Zilda e que embarcou ontem para Porto Príncipe, juntamente com o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e do embaixador do Brasil naquele país, Igor Kipman, em avião da Força Aérea Brasileira (FAB).

O corpo da fundadora e coordenadora internacional da Pastoral da Criança, Zilda Arns, foi encontrado pela embaixatriz do Brasil em Porto Príncipe, Roseana Teresa Aben-Athar Kipman. Segundo relato de diplomatas brasileiros que acompanham a tragédia no Haiti, o corpo estava sob os escombros da sede de um projeto humanitário, cuja laje desabara. Uma assessora de Zilda Arns continua desaparecida.

Médica pediatra e sanitarista, Zilda Arns é irmã do cardeal-arcebispo emérito de São Paulo, d. Paulo Evaristo Arns. Ela nasceu em Santa Catarina, em 1934. Dedicou sua vida a trabalhos de solidariedade, apostando na educação como ferramenta para combate a doenças infantis e à desnutrição. Em 1983, a pedido do irmão, iniciou os trabalhos da Pastoral da Criança, uma entidade que tem o apoio do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e atua em 27 países.

Um dos principais projetos que Zilda coordenava era o de Alimentação Enriquecida, que consistia em educar as populações carentes sobre meios de enriquecer a alimentação do dia a dia com alimentos disponíveis na região. Além da Pastoral da criança, Zilda Arns também estava envolvida na coordenação da Pastoral da Pessoa Idosa, e participava como representante da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) no Conselho Nacional da Saúde e no Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES).

Sua atuação rendeu diversos prêmios e homenagens no Brasil e no mundo, entre eles a comenda da Ordem do Rio Branco (2001), Prêmio de Direitos Humanos (2000), Personalidade Brasileira de Destaque no Trabalho em Prol da Saúde da Criança (conferido em 1998 pela Unicef), Heroína da Saúde Pública das Américas (conferido pela Organização Pan-Americana de Saúde em 2002), o prêmio Woodrow Wilson (2007), além de ter recebido o título de doutor honoris causa em cinco universidades. Em 2001, a Pastoral da Criança brasileira concorreu ao Prêmio Nobel da Paz, conferido ao então secretário-geral da ONU, Kofi Annan.

Arcebispo de Natal lamenta morte de Zilda

O arcebispo de Natal Dom Matias Patrício de Macedo lamentou a  morte da médica sanitarista, Zilda Arns, 75 anos, no Haiti, e lembrou que a médica foi exemplo vivo de que é possível salvar vidas, evangelizando. “É lamentável a sua morte, de forma tão inesperada.  Recebemos essa notícia com profunda dor e tristeza. Nos solidarizamos com a família, reconhecendo todo seu trabalho junto à Pastoral da Criança, um trabalho que para ela era uma bandeira e uma missão”. afirmou Dom Matias.

Dom Matias ressaltou o empenho da médica em expandir o trabalho realizado há décadas no Brasil para os países pobres da América do sul e central. “Zilda  era de uma família religiosa, e valorizava toda essa dimensão religiosa. Atuava como um verdadeiro religioso, olhando para o seu irmão com carinho e com cuidado”.

Zilda Arns estava no Haiti a convite da Conferência dos Religiosos daquele país. As coordenações da Pastoral da Criança, no Rio Grande do Norte e na Arquidiocese de Natal, também lamentaram sua morte. O coordenador arquidiocesano, Milton Dantas, lembra que Zilda Arns tratava os agentes da Pastoral como uma mãe trata o filho. “Ela era um exemplo de pessoa que sabia o que estava fazendo em defesa da vida. Exemplo cristã que tinha carisma em levantar ânimos”.

Para a coordenadora estadual, Marlúzia Pessoa, a morte de Zilda “deixa uma lacuna em nosso convívio, mas nos conforta pelos ensinamentos e exemplos deixados ao longo de sua trajetória pastoral”. E acrescenta: “Ela era uma mulher forte e que tinha um coração de mãe acolhedora. Seus últimos momentos foi realizando aquilo que ela acreditava: servir para que todos tenham vida”.

Zilda Arns esteve algumas vezes em Natal. A última foi há dois anos, num encontro regional da Pastoral da Pessoa Idosa. No final da tarde, a Arquidiocese de Natal divulgou nota oficial, onde diz que a notícia de morte causa intensa dor às famílias acompanhadas pela Pastoral da Criança no Rio Grande do Norte, tamanho era “o trabalho de resgate à vida proporcionado pela médica nos muitos lares sofridos pelos terremotos existenciais do dia a dia”.

Na nota oficial, o arcebispo destaca ainda a força de vontade e  a coragem da médica sanitarista em desbravar bolsões de miséria, “exemplos que ficam em nós como herança de possibilidade e certeza de alcance de resultados”. A médica fundou a Pastoral da Criança, em 1983. Hoje, são cerca de 260 mil voluntários que desenvolvem trabalhos na Pastoral, acompanhando 1,8 milhão de crianças, no Brasil e em outros países.

Desde 2008, Dra. Zilda deixou a coordenação nacional da Pastoral, passando a assumir a Pastoral da Pessoa Idosa, também fundada por ela. Atualmente, a médica ainda assumia a coordenação internacional da Pastoral da Criança. Em 2001, a Pastoral da Criança, através da Dra. Zilda, concorreu ao Prêmio Nobel da Paz, conferido ao então secretário-geral da ONU, Kofi Annan.

Trabalho da Pastoral nãoserá alterado

Curitiba (AE) – A morte da sanitarista e pediatra Zilda Arns não deve alterar o trabalho que está sendo realizado pela Pastoral da Criança em quatro mil municípios brasileiros e nos 22 países em que está instalada. A coordenação deve ser executada por Dom Aldo Pagotto, Arcebispo Metropolitano da Paraíba; Ana Ruth Góis (BA) e Silvio Santana (DF). O comando executivo ficará a cargo de Vera Lúcia Altoé.

Em entrevista coletiva ontem, na sede da entidade, na capital paranaense, Nelson Arns Neumann,  44 anos, filho e coordenador-adjunto da Pastoral, disse que sua mãe preparava os seus sucessores há algum tempo, quando se afastou da coordenação para assumir o trabalho de montagem da Pastoral da Pessoa Idosa. “Todo o conceito da Pastoral, o trabalho e a sua missão serão muito bem executados por essas pessoas, além dos agentes, dos voluntários, de todos que levaram adiante a filosofia de minha mãe, de trabalhar a vida e amar as pessoas”, afirmou.

Antes disso, porém, a direção da Pastoral deve acompanhar os trâmites para o translado do corpo de Zilda Arns, que foi localizado em Porto Príncipe, capital haitiana, mas depende das condições de transportes para que volte ao Brasil. “Em um momento que todo o mundo está ajudando e o aeroporto está a serviço de missões humanitárias, não podemos parar com esse processo para exigir alguma coisa. Isso gera uma expectativa, mas vamos esperar com calma”, ponderou.

Apesar de não ter a confirmação da data de chegada, Nelson afirmou que o corpo será velado na sede da entidade, em Curitiba, e será enterrada no Cemitério da Água Verde, ao lado do marido, Aloysio, e uma filha. “Dependemos, agora, do governo federal”, disse.

Durante a coletiva, Nelson lembrou a dedicação da mãe à Pastoral. “Ela teve uma filha que morreu em seguida, com alguns dias de vida, por causa de complicações do parto. Creio que essa situação fez com que ela, ao conhecer a dor da perda de um filho, lutasse a vida inteira para evitar que outras mães passassem por isso. No final, ela morreu cumprindo sua missão, fazendo o que mais gostava”, disse.

A morte de Zilda Arns causou comoção em todo o Estado. O governador Roberto Requião (PMDB) decretou luto oficial no Paraná por três dias.

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